domingo, 15 de março de 2015

O Fluxo da Fumaça


Algumas notícias, realmente, nos tiram o chão. Hoje, pela manhã, recebi uma dessas. Estava enfrentando o engarrafamento, como sempre, indo para o trabalho, quando o telefone tocou. Era de um número desconhecido e por isso quase não atendi…
   
- Alô?
-Alô, Rodrigo? - Não bastasse ser um número desconhecido, a pessoa sabia meu nome.
-Sim…
-É a Raquel - O nome não me ajudou muito, tentei associar o nome a algum rosto conhecido, foi como jogar aquele jogo de tabuleiro dos anos 90. - Tô ligando pra te dar uma má notícia. - Nesse instante eu quis me levantar, mas perderia rapidamente meu lugar num ônibus tão lotado. Pior, eu ainda não sabia quem era a Raquel nem o que ela poderia me dizer que seria uma coisa ruim de se ouvir.
-Ah…bem…fala…
-Lembra da Luísa? - Raquel… Luísa… Bingo! Conhecidas da época da escola, que fazia mais de 5 anos desde a última vez que as vi.
-Lembro… Lembro, sim. O que tem?
-Faleceu ontem de manhã. O enterro é hoje as três da tarde. 
- Nossa! - Por um momento foi tudo que eu pude falar e se seguiu um longo silêncio até que eu dissesse outra coisa. -Eu tô num ônibus super lotado - Tentei explicar minha reação imbecil - será que você poderia me mandar por mensagem o endereço de onde vai ser o sepultamento? -Uma maneira de fugir daquele telefonema desconfortável.
-Sem problemas… Bem…se poder, avisar ao resto do pessoal… Tchau!
Não tive tempo de me despedir. Também não avisei ao “resto do pessoal”, simplesmente por não saber quem poderiam ser. Tanto a Raquel quanto a Luísa eram conhecidas de noitada, vez por outra nos esbarrávamos em alguma festa, não éramos grandes amigos.
Atendi ao funeral, mas fiquei de longe. E a distância mesmo, acenei levemente com a cabeça para a Raquel, que, numa mistura de sentimentos, pareceu surpresa e feliz por eu ter comparecido. Feliz, é claro, dentro do que as circunstâncias permitiam. Confesso que não me lembro muito bem da Luísa, não sou dessas pessoas que possuem uma memória fotográfica, e o tempo afastado, também, contribuiu bastante com isso. Mesmo assim, preferi manter na memória o pouco que lembrava e não me aproximei do caixão.

O que de fato tirou meu sono e o meu chão, foi lembrar que ela era mais nova que eu dois ou três anos… É estranho pensar que algum conhecido seu poderia deixar essa vida antes dos vinte e cinco… Já passam das 3 da manhã, em breve terei que levantar para trabalhar, mas não deixo de pensar nisso… E em quantos dos que estavam comigo naquele ônibus lotado ou, até mesmo, no engarrafamento, são capazes  de reconhecer a própria mortalidade… O que assusta ainda mais é essa vida que segue…ou que seguimos…

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